MARSW e INFORBIOMARES: dois projetos-chave para a conservação marinha em Portugal | - CCMAR -
 

MARSW e INFORBIOMARES: dois projetos-chave para a conservação marinha em Portugal

 

 

- Terminaram, este verão, dois projectos essenciais para a implementação e gestão de áreas marinhas protegidas em Portugal: o MARSW e INFORBIOMARES. 
- Ambos os projectos desenvolveram trabalhos para caracterizar, monitorizar e recuperar os ecossistemas marinhos do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina do Parque Marinho Professor Luiz Saldanha, na Arrábida.
- Um objetivo comum a ambos os projetos, cumprido com sucesso, foi organizar um sistema de informação e monitorização para responder às necessidades de avaliação da conservação e medidas de gestão e ordenamento da biodiversidade nestas áreas marinhas protegidas. 

 
Conservação em ação: do Espichel ao Burgau!

As áreas marinhas protegidas são ferramentas essenciais para a gestão e conservação do oceano. Dos benefícios que podem trazer, destacam-se a conservação de espécies, habitats e ecossistemas marinhos, a recuperação de habitats que sofreram impactos, e a sustentabilidade de recursos pesqueiros importantes para as comunidades locais. Tal é o seu potencial para manter o oceano saudável, que a União Europeia e países de todo o mundo têm vindo a assumir o compromisso de implementar áreas marinhas protegidas em pelo menos 10% do oceano, valor este que poderá vir a subir para 30%, muito em breve. 

Contudo, para que sejam eficazes como ferramentas de conservação, as áreas marinhas protegidas requerem uma gestão ativa que inclua trabalhos de caracterização, monitorização, conservação e sensibilização ambiental. Seguindo o lema “O nosso oceano, o nosso futuro", o CCMAR, tem vindo a promover projetos que suportam a gestão de áreas marinhas em Portugal, juntamente com outros parceiros. Este verão viu o final de dois grandes projetos que decorreram entre 2017 e 2021: o MARSW, no Parque Marinho do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina (PNSACV), e o INFORBIOMARES, no Parque Marinho Professor Luiz Saldanha na costa da Arrábida. 

Estes dois grandes projetos científicos a nível nacional demonstraram que a criação de áreas marinhas protegidas, com proteção total ou parcial, em que as atividades humanas são proibidas ou muito restritas, são importantes para a conservação e restauração dos ecossistemas marinhos, e trazem grandes benefícios ambientais quando bem planeadas. Dos estudos realizados, foi possível observar um aumento de biodiversidade, mas também um aumento da população de peixes e da dimensão dos indivíduos.

 

O Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina: a maior área marinha protegida em Portugal continental

Por ser a maior área marinha protegida da costa portuguesa, o Parque Marinho do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina não possuía um mapeamento detalhado desta área. Ao longo das últimas três décadas, o CCMAR, em parceria com os polos da Universidade de Évora e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa do MARE, tem contribuído para o estudo e proteção da grande riqueza de espécies e habitats marinhos desta área marinha protegida. 

No desenrolar do projeto MARSW, os investigadores desenvolveram um conjunto de ferramentas que permite avaliar o estado de conservação do parque ao longo do tempo. Foi produzido e organizado conhecimento vital para a gestão da área marinha protegida, desde logo pela organização da informação pre-existente. Foi assim possivel perceber que nos seus 269 km2, vivem cerca de 1900 espécies diferentes de organismos marinhos como peixes, algas, moluscos e crustáceos, com 38 espécies com estatuto de conservação e 17 classificadas como endémicas. O mapeamento físico e biológico efetuado, utilizando multifeixes, sondas de varrimento lateral, dragas, arrastos de vara, mergulhadores, drones e robots subaquáticos (ROV) constitui uma base sólida para estudos que se venham a desenvolver nesta área. Foram descritos novos habitats marinhos para a classificação europeia EUNIS e para a convenção do Atlântico OSPAR (exemplos: jardins de gorgónias e agregações de esponjas de profundidade). 

Foi criada uma base de dados, funcional e integrada, que suporta um sistema de informação sobre a biodiversidade das áreas marinhas classificadas, interoperável com outros sistemas nacionais e internacionais. Em consonância com este procedimento de harmonização de métodos e resultados, este projeto liderou a criação de uma lista de indicadores de monitorização da rede de áreas marinhas protegidas, a nível nacional. 

Em termos de monitorização, os resultados do projeto mostram que as áreas de proteção mais estritas da Ilha do Pessegueiro e do Cabo Sardão, registaram não só um aumento da diversidade de peixes em cerca de 30%, mas também da sua abundância em cerca de 150%, e ainda um aumento de tamanho (até 20%) de algumas espécies com interesse comercial, como a abrótea e o linguado. Mais a sul, nos Ilhotes do Martinhal, através da amostragem com câmaras iscadas de vídeo estéreo, verificou-se que sobretudo os sargos, eram mais abundantes e de maiores dimensões dentro das zonas de maior proteção. 

Em função destes estudos foram feitas várias recomendações de medidas de gestão, como por exemplo, 1) a necessidade de manutenção da interdição da captura de sargos (defeso) aplicada à pesca à linha apeada, comercial e lúdica, e o alargamento desta à restante pesca lúdica (pesca de embarcação e submarina) e, caso possível, também à pesca comercial;  2) necessidade de avaliar a possibilidade de extensão do PMSACV, ao largo de Sines (baixas com jardins de coral), Sagres (canhão submarino de São Vicente com jardins de coral e agregações de esponjas) e costa sul (baixas com jardins gorgónias e de coral vermelho) e de se avaliar a possibilidade de criação de novas sem pesca (Proteção Parcial I) e/ou extensão das existentes em profundidade, ao largo de Vila Nova de Milfontes, Cabo Sardão, Azenha do Mar, Rogil, Arrifana e da Carrapateira, não esquecendo a proteção de habitats de substrato móvel e das falésias da Baleeira, de modo a proteger mais a diversidade do maior habitat do PNSACV, e o habitat de grutas marinhas submersas ou semi-submersas, respetivamente.

A componente de ensino, formação e comunicação do projeto MARSW foi muito forte. Das atividades de ensino e formação desenvolvidas, destacam-se a produção de várias teses de mestrado, várias aulas práticas lecionadas nas praias, workshops técnicos e participações em congressos nacionais e internacionais. A nível de comunicação, durante o projeto MARSW promoveram-se diversas ações de sensibilização ambiental junto das escolas, e desenvolveram-se vários materiais dirigidos a públicos diversos, destacando-se uma exposição itinerante, o livro “Áreas Protegidas da Costa Sudoeste”, e um site na internet com um geoportal associado, disponibilizando a todos e para o futuro toda a informação criada.  

 

O mar especial do Parque Marinho Professor Luiz Saldanha

Ao longo de 38 km de costa rochosa entre as praias da Figueirinha, na saída do estuário do Sado, e a praia da Foz, a norte do Cabo Espichel, as águas da costa da Arrábida-Espichel encontram-se protegidas pelo Parque Marinho Professor Luiz Saldanha. Desde 2007, que os investigadores do CCMAR e do ISPA têm vindo a promover a conservação no Parque Marinho, através do Programa BIOMARES. Integrado neste programa, o projeto Inforbiomares deu continuidade a diversas atividades que têm permitido caracterizar, monitorizar e recuperar a biodiversidade da costa da Arrábida, permitindo um trabalho de continuidade que é absolutamente essencial para uma gestão eficaz do Parque Marinho. 

Das muitas tarefas realizadas pelo projecto Inforbiomares, destacamos apenas algumas. Os trabalhos de caracterização dos ecossistemas permitiram inventariar mais de cem mil registos de cerca de duas mil espécies observadas no Parque Marinho entre 1797 e 2021. Tanta biodiversidade numa área tão pequena é sinónimo de um verdadeiro tesouro dos nossos mares e um oásis de vida marinha. Os dados de biodiversidade do Parque Marinho e zonas circundantes foram usados para avaliar a pertinência da alteração dos limites desta área protegida, revelando o elevado valor da zona envolvente ao Cabo Espichel, a qual surgiu nos diferentes modelos desenvolvidos como área prioritária para extensão dos limites do parque. 

Adicionalmente, dados recolhidos com câmaras com isco (BRUVs) relevaram que a zona circundante do Parque Marinho, incluindo as plataformas envolventes do canhão de Setúbal e do canhão de Lisboa, são também importantes zonas de berçário para diversas espécies, nomeadamente para os tubarões azuis. Os trabalhos de telemetria mostraram ainda que para algumas espécies de raias se verifica conectividade entre habitats do parque marinho e do estuário do Sado, ou seja, os animais deslocam-se entre os dois locais.  

Para apoiar a gestão do Parque Marinho, deu-se continuidade aos trabalhos de monitorização do efeito de reserva, com a mesma metodologia usada desde 2006. Estes trabalhos permitiram confirmar a tendência para encontrar uma maior densidade e biomassa de várias espécies de interesse comercial, como o sargo, nas zonas de maior proteção, desde a implementação do parque até à atualidade, reforçando o suporte científico para a manutenção das medidas de conservação estabelecidas no Parque Marinho. 

O projecto Inforbiomares deu ainda continuidade aos trabalhos de recuperação da biodiversidade, realizando transplantes de ervas marinhas, corais e florestas de algas castanhas, e monitorizando as populações naturais locais e dadoras destas espécies. No início do projeto já existiam no parque 110 m2 de ervas marinhas anteriormente transplantadas e no final do projeto, em 2020, com os novos transplantes a pradaria ocupava um total de 226 m2.

Por último, destacamos ainda a especial atenção dada à comunicação do Parque Marinho, tendo-se organizado diversas atividades dirigidas a veraneantes e às comunidades locais para promover o mar especial da Arrábida e o papel desta área marinha protegida para a sua conservação. O projeto desenvolveu ainda vários produtos de comunicação, como uma nova exposição permanente do Museu Oceanográfico do Portinho da Arrábida, com o tema “Arrábida: um laboratório natural para o estudo do oceano”, uma plataforma de ciência cidadã, a publicação do livro “UM MAR ESPECIAL: Parque Marinho Professor Luiz Saldanha”, a criação de um website dedicado ao Parque Marinho (o primeiro website dedicado a uma área marinha protegida em Portugal), uma exposição fotográfica itinerante e um mapa toponímico realizado com a colaboração de pescadores e agentes locais.

 

Toda a informação à distância de um clique

Em conjunto, ambos os projetos desenvolveram um sistema de informação e monitorização que permite conhecer a distribuição das comunidades e dos habitats existentes nestas áreas marinhas protegidas. Para o Parque Marinho Professor Luiz Saldanha, os registos estão publicamente disponíveis no geocatálogo de dados e metadados e no visualizador de registos de ocorrência de espécies. Para o Parque Marinho do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina os registos e mapas da distribuição das espécies e habitats marinhos, e também das principais atividades humanas na área, como a pesca comercial e lúdica, a aquacultura, a navegação, o turismo e a nautica, estão disponiveis ao público no site do projeto - geocatálogo e websig.

 

Parceiros juntam-se para apoiar a conservação marinha

Estes projetos vem confirmar o efeito de proteção das Áreas Marinhas Protegidas e mostram que estas têm um papel fundamental na conservação e proteção da biodiversidade, ecossistemas marinhos e espécies com interesse comercial. Os projetos INFORBIOMARES e MARSW foram coordenados pela Liga para a Proteção da Natureza (LPN), em parceria com o Instituto para a Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), e implementados pelas equipas científicas referidas acima. Ambos os projetos foram cofinanciados ao abrigo do Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (POSEUR), tendo o projeto INFORBIOMARES recebido co-financiamento por parte da SECIL e o MARSW recebido co-financiamento através do Fundo Ambiental e das câmaras municipais de Aljezur, Vila do Bispo e Odemira.